Coreia do Norte isola cidade depois de revelar caso suspeito de Covid-19
Segundo a agência de notícias KCNA, um homem que havia fugido para a Coreia do Sul há três anos retornou, de forma irregular, ao Norte, e apresentou sintomas da doença.
PYONGYANG — Um dos únicos dois países a, pelo menos oficialmente, não registrar infecções pela Covid-19 (o outro é o Turcomenistão), a Coreia do Norte reconheceu neste final de semana que a doença pode ter chegado a seu território. Segundo a agência de notícias KCNA, um homem que havia fugido para a Coreia do Sul há três anos retornou, de forma irregular, ao Norte, e apresentou sintomas da doença.
Os resultados dos exames não foram divulgados, mas logo depois da revelação, o líder do país, Kim Jong-un, ordenou o fechamento da cidade fronteiriça de Kaesong, onde o homem foi encontrado. Todas as pessoas que estiveram em contato com ele estão sendo monitoradas.
“As agências supremas declararam emergência na região em resposta ao incidente, implementaram o sistema nacional de proteção de emergência e comunicaram a decisão de emitir o aviso à direção central do partido”, diz o despacho da KCNA sobre a reunião onde a decisão foi tomada, um encontro presidido pelo próprio Kim Jong-un.
Desde a confirmação de que a doença estava se espalhando pelas vizinhas China e Coreia do Sul, o governo de Pyongyang adotou talvez as mais estritas medidas de isolamento contra a Covid-19 em todo o mundo. Desde fevereiro, as fronteiras estão fechadas, inclusive para muitos de seus cidadãos que se encontram no exterior. Voos e serviços de trem para a Rússia e para a China seguem suspensos.
Em fevereiro, o vice-ministro da Saúde afirmou ao jornal japonês Choson Sinbo (ligado à Coreia do Norte) que essas medidas continuarão em vigor até que uma cura esteja disponível.
Internamente, o governo vem realizando campanhas de conscientização, incluindo sobre o uso de máscaras e a necessidade de lavar as mãos, por exemplo. Reuniões públicas estão proibidas, locais como bares e restaurantes fechados e as escolas, depois de uma breve reabertura em junho, tiveram as aulas suspensas no começo de julho.
A própria redução nas aparições públicas de Kim Jong-un, que provocou uma onda de rumores sobre sua saúde e mesmo morte, estaria ligada à doença. De acordo com o serviço de consultoria sobre a Coreia do Norte NKPro, ele foi visto em público apenas sete vezes de abril a junho. No mesmo período do ano passado, foram 46 aparições.
Controles
Por outro lado, Coreia do Norte é um dos países que menos testa no mundo, especialmente pela dificuldade em obter os materiais necessários. Segundo o NKPro, organizações internacionais ofereceram apenas 12,5 mil testes ao governo local, e a Organização Mundial de Saúde reconhecia a realização, até o fim de junho, menos de mil testes realizados.
Além disso, falhas no controle das fronteiras marítimas e terrestres, especialmente com a China, e a entrada irregular de pessoas podem já ter levado a doença ao país há alguns meses. Em abril, o site Daily NK revelou que três militares e um médico morreram depois de apresentarem sintomas similares aos da Covid-19. Os resultados dos testes não foram divulgados. 70 pessoas que tiveram contato com eles foram isoladas. Em todo o país, segundo o NKPro, cerca de 600 pessoas ainda estão sendo mantidas em quarentena.
Apesar do questionamento ou não sobre os casos, a pandemia provocou efeitos que vão além de questões sanitárias. A mídia oficial reconhecia, desde março, um forte impacto econômico, decorrente da virtual suspensão das exportações para a China e a suspensão temporária de projetos de infraestrutura. O NKPro também relata um aumento dos preços de alimentos e itens básicos, em boa parte ligados à maior procura, especialmente entre fevereiro e abril.
A pandemia também levou ao cancelamento de eventos caros ao governo, como paradas militares, a tradicional maratona de Pyongyang, em abril, e feiras comerciais. Por outro lado, os jogos Arirang, talvez a mais imponente demonstração estética, ideológica e cultural do regime, devem acontecer em outubro, assim como os eventos relacionados ao aniversário de 75 anos da fundação do Partido dos Trabalhadores da Coreia, no mesmo mês.

Guerra da Coreia
Nesta segunda-feira, o país marcou os 67 anos da assinatura do armistício que colocou fim à Guerra da Coreia (1950-1953). Em um evento privado, Kim Jong-un ofereceu pistolas comemorativas a militares, e visitou um memorial aos mortos no conflito. No despacho da KCNA, a repetição do discurso oficial de que o Norte foi o vitorioso na guerra, que oficialmente jamais terminou e dividiu a península ao longo do Paralelo 38.
Na Coreia do Sul, um evento chamado “Dias de Glória” marcou a assinatura do armistício, reunindo militares, políticos e veteranos de guerra, respeitando o distanciamento social. Em discurso, o general americano Robert Abrams, que comanda as forças da ONU e dos EUA no país, afirmou que o conflito deixou a península em ruínas, causou imenso sofrimento aos coreanos e foi uma “grande tragédia na História humana”,
O conflito foi um dos mais violentos depois do fim da Segunda Guerra Mundial, deixando cerca de 5 milhões de mortos, mais da metade civis.